LUTA DE CLASSES | REVIEW

Sobre o que o dinheiro revela

Luta de Classes (ou Highest 2 Lowest), novo filme da Apple em parceria com a A24, é uma releitura ousada feita por Spike Lee. Inspirado tanto no livro homônimo quanto no clássico japonês Céu e Inferno, de Akira Kurosawa, o diretor imprime sua visão moderna e política à história, transformando uma trama de sequestro em um retrato sobre desigualdade social, sonhos e escolhas morais.

A base de tudo é o dinheiro — o que ele significa, o que ele faz com as pessoas e até onde elas estão dispostas a ir para mantê-lo ou conquistá-lo. Lee usa essa temática para tensionar não apenas os personagens, mas também o público, que se vê refletido nas situações apresentadas.

A trama acompanha um magnata da música que vê sua vida virar de cabeça para baixo quando o filho de seu motorista é sequestrado por engano. O criminoso buscava atingir diretamente o músico com seu filho, mas seu equívoco cria uma série de dilemas e discussões familiares que passam a sustentar a narrativa. O sequestro é apenas o gatilho.

Com ritmo lento e cadenciado, Spike Lee constrói a tensão pela densidade emocional. Cada diálogo, cada silêncio e cada decisão dos personagens é tratado como peça fundamental. O diretor se preocupa em explorar as personalidades e os contrastes que movem a história, e a paciência do espectador é recompensada pela riqueza de detalhes em cada interação.

No elenco, Denzel Washington entrega mais uma performance marcante, carregando nos olhares e nos gestos o dilema de um homem pragmático. Jeffrey Wright brilha explorando a fisicalidade e a expressividade com enorme habilidade, mesmo quando seu personagem está em segundo plano. A surpresa vem do rapper A$AP Rocky, que se arrisca na atuação e surpreende com segurança.

A música é, naturalmente, uma peça central. Não apenas como elemento da profissão do protagonista, mas como ponte cultural da narrativa. Spike Lee costura referências, homenagens e discursos através da trilha sonora, que mescla clássicos com composições originais. A$AP Rocky assina algumas músicas que não só dialogam com a trama, mas reforçam o peso do hip hop.

O terço final é o momento em que a tensão explode. Após o desenvolvimento cuidadoso, o cineasta leva a narrativa para cenários vibrantes — um metrô lotado transformado em palco de suspense e um festival porto-riquenho. A escala pode ser pequena, mas a maneira como o diretor transforma espaços comuns em ambientes de tensão reafirma seu talento.

No fim, Luta de Classes talvez não alcance o patamar das obras-primas de Spike Lee, mas ainda assim é um filme poderoso, repleto de comentários morais que se entrelaçam com o suspense. É uma produção que brilha pela coragem de seu tema, pela força de suas atuações e pela capacidade de atualizar uma obra clássica para o contexto contemporâneo. É sobre o que o dinheiro revela — e destrói — nas pessoas.

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